Redimensionar a carreira docente como um todo significa remodelar toda a educação básica, algo que não é nada trivial. Há pontos indiscutíveis, como o salário e formação inicial e continuada. Há outros, como a criação de comunidades educacionais envolvendo escolas e universidades, que parecem muito distantes, verdadeiras quimeras.
Há uma questão, porém, que pode escapar aos formuladores de políticas e aos pesquisadores universitários, mas que tem sido cada vez mais recorrente entre os professores que estão no chão das escolas de educação básica: a falta de escuta sobre o que eles querem e pensam.
Leila Coelho, uma experiente professora que rodou Norte e Nordeste, tornou-se doutora, mas preferiu retornar à escola rural de Bananeiras, cidade paraibana de pouco mais de 22 mil habitantes e a 140 km de João Pessoa, resume a reivindicação ao citar quais ações vê como exemplares: “relações mais dialógicas, tomada de decisões coletivas, enxergar e valorizar as potências de cada pessoa, reconhecer seu talento, proporcionar oportunidades de formação específica e geral”. Em suas andanças, Leila já ministrou aulas de química e matemática, além de língua portuguesa, objeto de seu doutorado.
As “relações dialógicas” mencionadas por ela têm sido uma reclamação constante em pesquisas realizadas junto a professores. Em junho último (2019), o Instituto Península divulgou levantamento qualitativo feito com 30 professores, em que houve forte menção à solidão do professor em seu dia a dia. As trocas com seus pares são poucas e a construção de sentidos é fragmentária.
Em meados de 2018, o Todos pela Educação divulgou levantamento feito com 2 mil docentes (Profissão Professor) em que as medidas mais eficazes para promover a valorização docente, para os entrevistados, seriam dar mais oportunidades de qualificação para aqueles que já estão atuando (69%) e envolver e escutar os professores nos debates públicos e decisões sobre políticas educacionais (67%).
Salários e excelência
O reconhecimento salarial é bem visto também. Entre os entrevistados de Trem das Letras, houve três menções ao Maranhão, estado que vem continuamente oferecendo o melhor piso salarial para professores com dedicação de 40 horas semanais (R$ 5.750).
A professora Francielle Santos também mencionou as redes estadual de Mato Grosso do Sul e municipal de Sobral (CE), citando planejamento, gestão e avaliação, além dos salários.
No plano internacional, a Finlândia continua a ser mencionada como exemplo de valorização e de práticas. Portugal, com reformulação mais recente da formação – além da proximidade cultural com o Brasil –, também ganhou menção como modelo a ser mais bem investigado para que aprendamos suas lições.
Um ponto distintivo em termos de exemplos é o mencionado por Priscila Cruz, do Todos pela Educação. Ela lembra que, ao visitar o Canadá, cerca de dez anos atrás, constatou a existência de um ator extra no mundo educacional: em Toronto, além do governo da província (o equivalente ao nosso estadual), do sindicato dos professores e das instituições formadoras, havia uma quarta instituição cuja atribuição era olhar para a valorização docente pelo prisma da manutenção da qualidade do serviço oferecido. Nessa divisão, ao sindicato cabia mais o acompanhamento das condições gerais de trabalho, salários etc. Ao Teachers´ Centre – essa quarta instituição – cabia pensar em conjunto sobre esses fatores, mas também sobre a formação docente (em parceria com o estado).
E havia uma tarefa adicional: verificar se os professores estavam dando conta de sua missão nas escolas, ajudando-os quando necessário. Em casos críticos, eles próprios pediam o afastamento do docente. A justificativa era de que um exemplo ruim poderia afetar a categoria como um todo. Ou seja, à agência cabia zelar pelo padrão de excelência docente.