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A possível perda da comparabilidade dos resultados das provas do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) é um dos temas que mobilizam os pesquisadores brasileiros da área de avaliação, tendo sido objeto de discussões na 10ª reunião da Abave, associação dos profissionais voltados à questão.
Essa perda deverá ocorrer quando da atualização da matriz de referência do Saeb, que se dará em função da implementação da nova Base Nacional Comum Curricular.
A matriz de referência relaciona as competências e habilidades requeridas dos estudantes e serve de base para a elaboração das questões das provas. Ao se mexer no conjunto de habilidades e competências requeridas, elas deixam de ser comparáveis ao longo do tempo. Ou ao menos aquelas que sofrerem modificações conceituais expressivas.
Esse processo ainda não ocorrerá no Saeb de 2019, cujas provas vão acontecer entre 21 de outubro e 1º de novembro. Por determinação do Inep para que por ora se mantenha a comparabilidade das provas, os exames de língua portuguesa e matemática para 5º ano e 9º ano do ensino fundamental e para o ensino médio serão feitos com base na matriz de referência pré-BNCC. Ainda não há previsão de quando será feita a mudança.
Já no caso da avaliação da alfabetização, haverá adequação à BNCC no ano de aplicação da prova, passando do final do 3º para o final do 2º ano do fundamental. Outra novidade é a introdução de questionários para os professores de creches e pré-escolas públicas ou conveniadas.
“Tecnicamente possível”
Para o ex-presidente do Inep e atual presidente da Abave, Joaquim Soares Neto, da Universidade de Brasília, a utilização da Teoria de Resposta ao Item (TRI), instrumento adotado pelo Saeb desde 1995, permite que haja uma transição, mantendo-se a comparabilidade. “É possível fazer sem que haja perda da comparabilidade histórica, desde que se adotem critérios metodológicos adequados”, diz.
Essa comparabilidade, no entanto, tende a ser apenas numérica, pois, na medida em que a matriz for modificada, haverá questões de fundo que poderão ter o mesmo peso, mas não serão as mesmas, ou seja, não estarão medindo os mesmos aspectos.
Neto diz que tem de haver uma nova matriz, pois houve uma mudança de filosofia com a adoção da nova BNCC.
Nova série histórica
Já Adriano Borgatto, professor do departamento de Informática e Estatística da Universidade Federal de Santa Catarina, acredita que pode haver um período de uso misto das duas matrizes, preservando-se uma parte para a comparação, ou, caso as mudanças sejam substanciais, pode ser inaugurada uma nova série histórica, com uma nova matriz.
Segundo o pesquisador, quando as provas estaduais e municipais utilizam a matriz do Saeb elas de certa maneira já promovem um deslocamento em relação ao documento original. “Essas avaliações colocam especificidades de estados e municípios na prova. A suspeita é que essas particularidades já estejam mexendo um pouco na prova, pois em geral há alguma diferença na escala”, exemplifica.
Ou seja, a comparabilidade pode não ser um valor absoluto. Para Borgatto, um fator mais importante do que esse é como está sendo feita a devolutiva do resultado das avaliações para as escolas, se isto tem sido feito de forma que coordenadores e professores estejam tendo bom entendimento dos resultados educacionais.
Outros temas importantes
Para Joaquim Neto, a reunião da Abave mostrou a solidez da avaliação educacional no Brasil. “Houve discussões sobre todos os níveis educacionais, da educação infantil à pós-graduação, com participação de 12 convidados internacionais”, ressaltou.
Para ele, do ponto de vista técnico, a interlocução com o MEC e o Inep continua sendo boa.
“Mas as coisas não dependem só de fatores técnicos, há questões relativas aos planos do governo e da política”, diz Neto. Do ponto de vista técnico, discussões que mobilizaram os cerca de 450 participantes foram sobre a incorporação de tecnologia para realização das avaliações e a oferta de novos instrumentos para medir competências complexas, como, por exemplo, as que envolvem habilidades cognitivas e não cognitivas.
A adoção do Pisa for School também é vista como uma tendência para redes e escolas que queiram balizar-se por padrões internacionais. Como se sabe, o Pisa é a avaliação internacional para estudantes na faixa dos 15 anos. A opção permite a escolas e redes fazerem o teste em separado para comparar seus resultados com os outros participantes da OCDE.
No quesito “tema para debates candentes” está a avaliação da educação infantil. No centro do debate destaca-se a questão de avaliar ou não o desempenho cognitivo das crianças. Ainda que o uso de instrumento similar seja justificado com o argumento de que não haverá individualização de resultados, e sim como diagnóstico de possíveis desenvolvimentos da etapa, há temor de que os resultados sejam utilizados para excessiva escolarização da etapa.
No anúncio que faz da introdução dos questionários de avaliação para professores de creches e pré-escolas a partir do Saeb deste ano, o Inep ressalta que as crianças não serão avaliadas, apenas o processo de ensino e aprendizagem. Trem das Letras voltará ao tema brevemente.