Os trens são símbolos recorrentes da modernidade. Desde o início do cinema, com o registro dos irmãos Lumière, eles são uma das imagens mais frequentes quando se quer evocar o espírito do moderno, de uma nova velocidade que tomou conta do mundo entre os séculos 19 e 20.
É bem verdade que esta já foi completamente superada não só pelos atuais trens de altíssima velocidade, mas também pelos diversos dispositivos do mundo digital.
Mas os trens continuam a simbolizar também uma mobilidade até então pouco acessível, um processo de urbanização que marcou nossas sociedades. Com essas mudanças veio também a ideia de escolarização universal, da educação como um requisito fundamental para equilibrar as relações sociais, incentivar a cidadania e a vida democrática.
Nós, aqui em nosso país sempre lento e restritivo para reproduzir direitos universais, somos mais rápidos para absorver novidades tecnológicas. No caso do trem, levamos entre 30 ou 50 anos, a depender do marco que se quiser escolher entre os disponíveis na história inglesa.
Bem, tanta introdução é para dizer que Trem das Letras chegou com atraso, apesar de não ter marcado data. Mas levou quase um ano para ficar pronto, e ainda assim nasce pequeno. Mas traduz uma escolha: neste momento em que temos poucas convergências – seja nos canais de comunicação, seja na arena política nacional ou internacional – é uma opção por tentar olhar para seus temas de forma particular, sem os imperativos do mercado.
A aspiração aqui é a de trazer repertórios variados e questões educacionais que estão submersas na agenda pública. É uma tentativa de olhar o pouco visível, de reportar aquilo que não está sob o foco das luzes mais potentes. Um pouco como o personagem vivido por Buster Keaton em A General (foto), que reconquista uma locomotiva que havia sido tomada de assalto pelo exército da União, mas o faz apenas para conquistar a moça que é um de seus amores. O outro, obviamente, é a locomotiva.
Se for possível seguir por uma rota com um pouco dessa singularidade de Keaton, Trem das Letras carregará uma tripulação, ainda que pequena, realizada.