Nas duas últimas décadas, etapa entrou no foco das políticas públicas

Descobertas da neurociência e pesquisas de retorno sobre o investimento educacional foram decisivas

Foto: Freepik

A partir deste século, as descobertas da neurociência  (que já vinham ocorrendo desde os anos 1990) mostrando o número exponencial de sinapses ocorridas nos primeiros anos de vida e o Prêmio Nobel concedido ao economista James Heckman, evidenciando as vantagens sociais e econômicas de se investir na primeira infância, provocaram grande atenção mundial acerca da educação infantil.

Em sua pesquisa, Heckman, professor da Universidade de Chicago, avaliou o retorno do investimento em educação infantil e chegou à conclusão de que trazia diversos benefícios, tais como menores índices de criminalidade e da taxa de gravidez adolescente, menor evasão no ensino médio e melhor produtividade no trabalho.

Em entrevista à revista Veja quando veio ao Brasil em 2017, calculava um retorno anual de mais US$ 0,14 para cada dólar investido na primeira infância ao longo de toda a vida do beneficiário. Em sua visão, um investimento mais vantajoso do que a Bolsa de Valores.

Muito em decorrência de seus achados, vários países passaram a investir mais em educação infantil e a avaliar a eficácia do investimento. No Brasil, a Constituição Federal foi modificada em 2009, aumentando a obrigatoriedade da educação básica dos 6 aos 14 anos para 4 a 17 anos, ou seja, com acréscimo de anos da escolaridade obrigatória na pré-escola e no ensino médio.

Como a oferta de vagas em creches era pequena, de cerca de 15% (contra 9,4% em 2000), e a meta proposta para o Plano Nacional de Educação em 2010 (só aprovado em 2014) era aumentá-la para 50%, União e estados aceleraram o investimento. Quando eleita da primeira vez, Dilma Rousseff (PT) prometeu ajudar os municípios na construção de 6 mil novas unidades. Geraldo Alckmin (PSDB), reeleito governador de São Paulo em 2014, prometeu financiar outras mil no estado. 

Queda nos investimentos

Os repasses federais para os municípios começaram a cair depois de 2014, quando R$ 506,6 da União foram para os municípios no primeiro quadrimestre daquele ano. Em 2015, início da recessão, o valor caiu para R$ 173,7 milhões nos primeiros quatro meses. Em 2018, no mesmo período, foram R$ 81,6 milhões, contra apenas R$ 10,2 milhões em 2019, segundo dados do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).

Com isso, os objetivos do Plano Nacional de Educação passaram a ter resposta muito lenta. No caso das creches, o país saiu de 31,8% em 2014 e hoje está em 35%, segundo o Observatório do PNE. Já na pré-escola, a oferta deveria ter sido universalizada em 2016, mas passou de 91,5% em 2014 para 93,8% em 2018.

Com menos dinheiro, o apelo à racionalização dos investimentos e pela qualidade torna-se maior. De um lado, pode-se dizer que houve progressos substantivos. Em 2000, por exemplo, havia apenas 11% das professoras de creche com curso superior. Hoje, apesar da qualidade duvidosa de muitos cursos, esse número já atinge os 66%.

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Curtas

  •   Teve início em 29/06  a websérie “Caminhos do Devir – Volta às aulas pós-Covid-19”, com o debate sobre “Como aplicar a gestão de crises para planejar a volta às aulas de forma segura”. Os educadores e sócio-fundadores da Devir Projetos Educacionais, Luis Laurelli e Eloisa Ponzio, além do consultor Flávio Schmidt, consultor em gestão de crises do Grupo Trama Comunicação, analisaram as estratégias, cuidados e precauções para garantir uma volta às aulas que possa assegurar a saúde de professores e crianças e a tranquilidade das famílias. A conversa teve a mediação do editor do Trem das Letras, Rubem Barros. O encontro marcou também o lançamento do e-book “A Covid-19 nas escolas e o caminho para a retomada do presencial”, disponível para download, que pontua sobre os passos da retomada.  Texto publicado em 25/06/2020

  • O ano de 2020 marca o final do mandato de 12 dos 24 conselheiros do CNE, o Conselho Nacional de Educação. A primeira lista com sugestões de substitutos, deixada pelo ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, provavelmente na correria a caminho do aeroporto, era composta principalmente por olavistas. Gerou resistência até dentro do próprio governo Bolsonaro. Diante do freio, puxado pelos militares, o ministro interino, Antonio Paulo Vogel de Medeiros, está fazendo uma nova rodada de discussão para a escolha de outros nomes.  A Casa Civil será um dos principais interlocutores para definir a lista final. Se o padrão das escolhas continuar o mesmo de outras áreas, é provável que as escolas cívico-militares ganhem fôlego inaudito. Texto publicado em 25/06/2020

  • Além do Fundeb, é preciso ficar de olho na possível votação da Medida Provisória 934, que estabelece normas de excepcionalidade para a educação básica e superior em 2020. O relatório da deputada Luísa Canziani (PTB/PR) manteve entre as emendas que devem ir a plenário a liberação da obrigatoriedade do cumprimento das 800 horas para a educação infantil e de oferta da educação a distância na mesma etapa. A relatora deixa a decisão nas mãos dos gestores municipais. Além de contrariar todas as evidências científicas e pedagógicas que enfatizam os prejuízos da educação a distância para as crianças de até 5 anos, a medida pode significar a abertura da porteira para os grupos privados que atuam no negócio da educação a distância. Com as redes de ensino sufocadas pela falta de dinheiro, com aumento das despesas por causa da pandemia e queda na arrecadação de impostos de até 24%, impactando diretamente no Fundeb, principal fonte de recursos para a educação básica pública, a EAD pode ser vista por muitos como solução milagrosa. Mas será apenas um instrumento para cumprir a obrigação legal de oferta de ensino. E inadequado, no caso da educação infantil. É preciso ver o que falará mais alto, se o rigor burocrático ou o bom senso. Texto publicado em 25/06/2020

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