Foto: Travis Soule/Iso Republic
Publicado em 29/10/2019
O pensamento escolhe um ponto
E o leva ao horizonte Não se sabe bem pra onde,
Nem sempre erra o caminho.
Educar, por exemplo, é quase sempre agir
Não para mudar o outro a nosso capricho
Não para fazê-lo seguir o nosso destino.
Educar é preparar o espírito
Para que ele mude se algo melhor ouvir.
É tratar cada fato por mais de um ângulo
Buscar a resposta que resista ao tempo feliz
Defender direitos e deveres na cara do juiz
Ver a diferença sem ameaça ou pânico
Evitar que se vomite ante
Freud, Einstein, Dante, Davi
Nietzsche, Darwin, Marx, Adam Smith
Bocage, Sade, Nelson Rodrigues
Eisenstein, Luther King, David Lean
Maiakovski, Obama, Lula ou Machado de Assis.
Os filhos chegam fanáticos, grosseiros, racistas, covardes
Os pais fanáticos de filhos fanáticos dizem em seus lares:
Professores liberais não ensinam, só doutrinam
Iguais aos nazistas, à esquerda fascista, aos terroristas
Numa democracia ninguém deveria ter o desgosto
De ser exposto a alguma crença que o contradiga.
A ideologia evita a violência física:
“Pare de fazer pergunta besta!”
A violência parece até honesta
Quando é a gente que vende a ideia fixa
Ao negar a crença no atacado Sem discuti-la no varejo
Enfiar goela abaixo A qualquer preço Em qualquer frente
O diário de Anne Frank
Elogiar com cara de santo
Mas no fundo indiferente
A gays, vida obesa, negra ou indecente.
Educar é ampliar o tamanho da plateia
É conversar com todo tipo de galera
Fora do conforto de falar a iguais
Sem ser o dono das evidências finais
Mas das evidências que cantam ao calor das ofensivas
É fazer da busca a sua fortaleza
Por outras vidas outros guias outros cantos
E nunca deixar aberto o flanco
À primeira ofensa que se ofereça.
Não há no mérito da mais honesta certeza
Nada que seduza alguém só por encanto.
Richard Rorty (1931-2007),
Fonte: Jürgen Habermas e Richard Rorty. Filosofia, racionalidade, democracia. Organização e tradução: José Crisóstomo de Souza. São Paulo: Editora Unesp, 2005.